segunda-feira, 17 de junho de 2013

Queridos, encolhemos o FIT!

Mudanças encolhem o Festival Internacional de Teatro

Mudanças no Festival Internacional de Teatro, como a abertura para poucos no Municipal, diminuem o tamanho do evento e afastam a população.

     Duas semanas atrás, a notícia de que a abertura do 13º Festival Internacional de Teatro (FIT) seria realizada no Teatro Municipal “Humberto Sinibaldi Neto” caiu como uma “bomba” no colo dos rio-pretenses. Parte da classe artística tem usado as redes sociais para manifestar seu descontentamento com a escolha. A partir disso, ações pacíficas têm sido discutidas para chamar a atenção das autoridades e da população.
     A mudança de endereço não deve ser lida como um fato isolado, mas “a ponta de um iceberg”. Em mais de quatro décadas de trajetória, o evento nunca esteve imune a crises. Mas, ao que tudo indica, a edição 2013 pode ser uma das mais turbulentas até agora. A principal preocupação é que o festival se torne uma mera mostra a preencher o calendário local, sem força para movimentar de fato a cidade.
     “Desde a Grécia antiga, o teatro representa encontro, festa, integração. E há muitos anos a gente não vê esse encontro se estabelecer na cidade. O festival precisa encontrar novos rumos. Fazer uma abertura a portas fechadas não só é um retrocesso como uma forma de exclusão”, diz Homero Ferreira, diretor da Cia. Hecatombe, que está na programação do FIT com “Cheiro de Carne”.
     Além de entraves com a Justiça e o Corpo de Bombeiros, que restringem as opções de espaços públicos, a falta de dinheiro tem feito com que o festival passe a impressão de estar sendo “achatado”. São menos grupos, menos cadeiras, menos diálogo. Para Jorge Vermelho, diretor da Cia. Azul Celeste, que esteve à frente do FIT de 2001 a 2009, os patrocinadores se afastaram justamente porque o festival não representa mais uma possibilidade de inovação. Na opinião dele, isso seria culpa da gestão do prefeito Valdomiro Lopes (PSB).
     “O FIT deixou de mobilizar a cidade e isso implica em um imediato afastamento das pessoas. O festival perdeu em conceito, em envolvimento com os artistas e não representa mais um espaço de troca. Fazer um festival não é só juntar uma série de espetáculos e colocá-los nos teatros. Fazer um festival requer conhecimento da área e proposição de ações que visem ao encontro, à provocação e à reflexão.”
     Quem está do outro lado minimiza as críticas. “Não acredito que o festival esteja sendo achatado. Particularmente, defendo as mudanças de dinâmica e formato, especialmente num evento de tantos anos”, diz Marcelo Zamora, diretor da Virtual Cia. de Dança, que se desligou da coordenação executiva há pouco mais de um mês.
     Na opinião do secretário de Comunicação Social e um dos coordenadores-gerais do evento, Deodoro Moreira, o público continuará a participar do FIT com a mesma intensidade das edições anteriores. “Não há uma diminuição grande de recursos. As perdas sempre foram compensadas com rigor e economicidade na infraestrutura, sem jamais prejudicar a qualidade e a quantidade de espetáculos. Todos os festivais do País têm contratempos, o FIT não é exceção.”
     Discurso semelhante é o do gerente do Sesc e também coordenador-geral do evento, Sebastião Martins. “A programação foi muito bem elaborada pelos curadores. Todas as ações são feitas para agregar cada vez mais valor e público.” Alexandre Costa, secretário de Cultura e terceiro coordenador-geral, admite que não pode fechar os olhos para os problemas dos últimos anos. “Em 2013, muitos festivais passaram e ainda passam por dificuldades, principalmente no tocante aos incentivos e apoios culturais. Mesmo assim, estamos cientes da responsabilidade e da importância do FIT.”
     Ele diz que compreende os anseios e as necessidades da classe artística, principalmente no que se refere à integração ente artistas e público. Por outro lado, prefere não fazer comparações com o passado. “Pretendo realizar um evento durante o festival em que convidados, coordenadores e representantes de grupos teatrais possam discutir a importância do FIT para a cidade. Acredito que vamos dar início a uma série de debates que vão escrever o projeto de 2014.”
Abertura de 2007 com grupo francês Transe Express (foto), na Represa, teve manifestação com apitos e distribuição de panfletos.
Classe artística planeja um ‘boicote’ à abertura do FIT
     A Associação dos Artistas, Técnicos, Produtores e Gestores de Cultura de Rio Preto e Região (Associart) e alguns artistas independentes da cidade querem protestar na porta do Teatro Municipal “Humberto Sinibaldi Neto”, no dia 4 de julho, durante a abertura do 13º Festival Internacional de Teatro (FIT).
     A ação é definida pelo grupo como um ato público pacífico e apartidário de solidariedade àqueles que não poderão participar da celebração de abertura do evento. Ricardo Matioli, diretor da Cia. Palhaços Noturnos e um dos líderes do movimento, chegou a cogitar pelo Facebook a hipótese de uma espécie de “apitaço”. Mas, a princípio, o boicote será caracterizado apenas pelo uso de camisetas com a frase “Abertura do FIT 2013 - Eu Não Fui”.
     “Foi uma atitude elitista e comodista dos organizadores. Se não somos ouvidos dentro de uma sala, vamos para as ruas, mesmo sabendo de possíveis retaliações. Ainda não decidimos se vamos fazer alguma performance”, afirma ele. O encontro está marcado para as 19 horas - uma hora antes da atração. Artistas, estudantes e comunidade em geral estão convidados a aderir à ideia. A intenção é aglomerar, no mínimo, cem pessoas.
     Esta não seria a primeira vez que o período do festival é usado para manifestações de insatisfação com a política cultural da cidade.
     Em 2007, por exemplo, o próprio Matioli e outros profissionais distribuíram panfletos e apitos aos espectadores para protestar contra a Secretaria de Cultura, sob a acusação de terem sido excluídos do FIT. O Orkut também foi usado pelo movimento na época.
     “Talvez seja mesmo a hora de os apitos voltarem às ruas, porém, agora, com objetivo artístico e de avanço, não com teor de oportunismo político”, alfineta Jorge Vermelho, que era diretor do festival na época. “O Sesc deve ser peça fundamental nessa mudança e não ser conivente com os atuais desmandos da atual administração. Se é para renascer, apite!”, completa.
Grito em silêncio
     Os integrantes da Cia. Cênica se reuniram na última semana e encontraram outra saída. “Em respeito aos artistas de fora, não vamos fazer barulho. Sem diálogo, temos um debate vazio, uma briga de um só lado”, diz o diretor Fagner Rodrigues. Segundo ele, a trupe não pretende participar de nenhuma atividade - até porque estará em um novo processo de montagem - nem deve se inscrever nas próximas edições.
     “O grupo existe durante todo o ano, não só no FIT. Por isso, a partir de agosto, queremos levar nossos espetáculos a bairros da periferia, por conta própria. A ideia é fazer pelo menos uma sessão a cada dois meses”, planeja Rodrigues.
     Paralelamente, o grupo foi selecionado para o 3º Festival Nacional de Teatro Pontos de Cultura e Grupos Independentes - Troféu Francisco Pellé, a ser realizado em setembro, em Floriano (PI).
Costa diz que a organização cogitou vários espaços abertos.
‘Tentamos de tudo’, defende-se secretário
     A abertura do 13º FIT será no dia 4 de julho, às 20 horas, no Teatro Municipal “Humberto Sinibaldi Neto”, com a peça “Discurso de un Hombre Decente”, da companhia colombiana Mapa Teatro. Apesar da ligação história entre a casa de espetáculos e o evento - foi lá que o festival surgiu, no início dos anos 1970, com caráter amador - a escolha reduz drasticamente o acesso do público.
     Desde 2002, a apresentação inaugural do FIT era realizada no Anfiteatro “Nelson Castro”, às margens da Represa. Mas, há um mês, o juiz da 1ª Vara da Fazenda de Rio Preto, Marcelo de Moraes Sabbag, proibiu a realização de eventos naquele lugar. A decisão é reflexo de uma ação civil pública do Ministério Público, por conta de denúncias da vizinhança referentes ao excesso de ruídos.
     A estrutura do local permitia que cerca de 5 mil pessoas acompanhassem as apresentações. Além disso, nas três edições mais recentes, a organização do evento montou uma arquibancada metálica, com 2 mil lugares extras. Ou seja, a capacidade do Teatro Municipal - 424 poltronas - corresponde a menos de 10% da quantidade total de pessoas que lotavam o ponto de encontro ao ar livre.
     Chegou-se a cogitar a possibilidade de uma abertura descentralizada, isto é, com apresentações simultâneas em diferentes bairros. Porém, o modelo implicaria em aumento de cachês, o que seria inviável do ponto de vista financeiro.
     O secretário de Cultura de Rio Preto, Alexandre Costa, explica que, quando a organização percebeu ser impossível utilizar a Represa, pensou em vários locais abertos. “Todos nós gostaríamos de reunir pelo menos 5 mil pessoas na Represa, mas não depende de nossa vontade. Cheguei a mandar pintar a arena existente na Praça Cívica, pensando em abrigar a abertura do FIT. No entanto, já fomos acionados pelo Ministério Público devido à utilização do local na Virada Cultural Paulista. Ou seja, tentamos de tudo”, defende-se.
     Ainda segundo o secretário, planeja-se uma reunião durante o festival com representantes da Prefeitura, da Câmara, do Ministério Público, do Poder Judiciário, das Polícias Militar e Civil e do Corpo de Bombeiros para buscar alternativas para o uso de espaços públicos nas atividades culturais.
     De acordo com o promotor de Justiça Sergio Clementino, o Ministério Público não ingressou com ação civil pública para impedir eventos na Praça Cívica. “Foi registrada apenas uma reclamação de morador, que tinha uma pessoa doente na família e ficou incomodado com o barulho.”
Matéria: Daniela Fenti